quinta-feira, 10 de julho de 2008

da Cor do trigo maduro


Enfim não eras meu álibi
de longe apenas uma figura flavi
Posso ser uma alimaria flébil e febril,
um pouco mais que sempre...
Sou esse bicho alinegro
que deseja alijar-se
ou alimentar-se
deste ser flavo
Flerto,
sem me fletir,
me curvar
gosto,
às vezes de você,
às vezes de um homem alindado, inventado...
Com quase um instinto de lembranças alistridentes
Ainda eu, bicho, espero só o momento para aliciar-te
*
falvi/flavo: dourado, louro; da cor do trigo maduro
flébil: lacrimoso, plangente
alinegro: de asas negras
alijar: aliviar a carga
fletir: dobrar
alistridente: que faz barulho com as asas

Dionisíaco

ÓCIO

Acordo! Antes do cigarro, uma manchete no jornal da T.V., o sol na fresta na sala calada, o ronco do quarto ao lado, os mínimos detalhes confusos do despertar. Procuro, mas perdi o controle a algum tempo, ah... antes um cigarro!É bom não acordar de ressaca, mas aí agente começa a prestar muita atenção na TV; Garota morta pelos pais, garotos pelos pais, polícia sobe o morro. O sangue não só escorre pelas bandas de lá. A corrupção está por todos os lados que ainda consigo ver mas nenhuma novidade, nada que realmente interesse. O suor da testa de cada dia não rastreia meus passos, pegadas não deixo forjo e faço coisas que já me agradam em partes. Escondo atrás das atrocidades que não tive tempo de cometer, grito calada.Cometo crimes, poucos consideráveis, detestáveis apenas pela falta de sentido que satisfazem pouco de mim, como um acorde. Olhares despercebidos a míngua. Agrado poucos, loucos que consomem minha lucidez, divido pensamentos desconexos, associo palavras e pessoas. Alucino ao fim da tarde, perto de não sei quem, ainda. Um acordo para meu sono.

ELE

Ainda dopada de veneno
que me dosa o humor
Veneno seu ou de qualquer outro
que não me mata,
me desce a garganta
como cachaça barata
e o gosto que gosto,
desta rejeição passiva,
desta solidão passiva,
de todos os gritos ouvidos,
dos prazeres sutis percebidos.

Talvez isso sirva
minha acomodação...

Seria cruel agora
Fazer entender um porque
desta morte
desta contradição
deste ópio
que me faz sentir entre arames farpados.

Superficial

(Magritte)
Na calçada,
paro por um pedaço de papel
escrito em poucas palavras,
em versos versados do avesso
de qualquer romance
(cem gramáticas que nos prendem!)
No canto,
o vento vela o sono de um velho mendigo
o vistoso homem vê a cena à vontade
e em vão,
passa seus olhos pela viela
No canto quase falado, na carta de amor
já esquecida na sarjeta,
algum desencontro
(quase safado)
marcam amores e amantes que não se tocaram
sacramento consumado somente pelo consolo da alma.